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6 - MANDADO DE SEGURANÇA UVA

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Acórdão

 

21969-19.2000.8.06.0167/1  APELAÇÃO CÍVEL
Relator: Des. ANTÔNIO ABELARDO BENEVIDES MORAES
Orgão Julgador : 3ª CÂMARA CÍVEL
APELANTE : FUNDAÇAO UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAU - UVA
APELADO : MARIA GORETTI RODRIGUES CHAVES

ESTADO DO CEARÁ
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

PROCESSO Nº 2000.0176.3687-7/1.
APELAÇÃO CÍVEL - COMARCA DE SOBRAL - 5ª VARA.
APELANTE: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ - UVA.
APELADA: MARIA GORETTI RODRIGUES CHAVES.
RELATOR: DES. ANTÔNIO ABELARDO BENEVIDES MORAES

EMENTA: ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. TRANSFERÊNCIA EX OFFICIO. SERVIDORA PÚBLICA ESTADUAL. INSTITUIÇÕES NÃO CONGÊNERES. IMPOSSIBILIDADE. DEFERIMENTO DA LIMINAR. DECURSO DE MAIS DE 6 (SEIS) ANOS. SEGURANÇA DAS RELAÇÕES JURÍDICAS. SITUAÇÃO FÁTICA CONSOLIDADA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Têm os Tribunais Superiores entendimento pacificado segundo o qual a transferência ex officio de servidores públicos estudantes e/ou de seus dependentes pressupõe a observância da congeneridade das instituições envolvidas - de pública para pública, de privada para privada.
2. Na hipótese, a impetrante/recorrida, embora oriunda de instituição privada, mas sob a proteção de liminar, matriculou-se e vem freqüentando, quiçá concluindo, o curso de Direito da Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA desde 2002, portanto, há mais de 6 (seis) anos, sem que o recorrente tenha se insurgido contra a medida, interpondo o recurso próprio.
3. Em virtude da situação criada pelos efeitos da liminar concedida, transformada em definitiva pela sentença ora atacada, há de ser mantida a decisão, em face da situação fática consolidada, mercê da inércia constatada.
4. Acaso revertida a medida, dado o vício inaugural, adviriam malefícios à apelada, servidora pública estadual, à instituição judiciária, da qual é integrante após regular concurso público e à própria sociedade, sem qualquer benefício individual ou coletivo.
5. Recurso conhecido e desprovido.


ACÓRDÃO

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Turma Julgadora da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso apelatório, para negar-lhe provimento, nos termos do voto do relator, parte integrante deste.

Fortaleza, 16 de junho de 2008.


RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pela FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ - UVA contra sentença (fls.50/52) prolatada pela Juíza da 5ª Vara da Comarca de Sobral que concedeu a segurança pleiteada no presente writ por MARIA GORETTI RODRIGUES CHAVES, determinando sua transferência do curso de Direito da SESPI - Faculdade Piauiense para o curso de Direito da Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA.

A recorrente sustenta, em suas razões, a impossibilidade do acolhimento do pleito autoral, uma vez que a Lei Federal nº 9.394/96 não permite a transferência ex officio de universidade particular para pública como pretende a recorrida (fls.55/61).

Contra-razões às fls.66/77, pela manutenção da decisão a quo.

Observadas as formalidades legais, subiram os autos a esta Corte de Justiça.

Manifestou-se a Procuradoria Geral de Justiça às fls.90/93, pelo desprovimento do recurso.

É o relatório, no essencial.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso de apelação.

No caso, MARIA GORETTI RODRIGUES CHAVES, servidora pública estadual - Técnica Judiciária da Comarca de Chaval -, cursava Direito na SESPI - Universidade Piaiuense, situada na cidade de Parnaíba/PI, quando, atendendo solicitação do Diretor do Fórum da Comarca de Sobral, o então Presidente deste Tribunal, concedeu sua disposição para o Fórum de Sobral, passando a exercer suas funções na 2ª Vara.

Por tal motivo, e visando dar continuidade aos estudos, requereu junto a Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA transferência ex officio para o curso de Direito, sendo seu pedido INDEFERIDO.

Inconformada, impetrou o mandamus pleiteando, liminarmente, a mencionada transferência, a qual foi DEFERIDA pela magistrada a quo, em 30 de abril de 2002 (decisão - fls.24/26).

Depreende-se dos autos que, do decisum a impetrada não interpôs recurso, tendo tão-somente apresentados as informações de fls.30/35, requerendo a revogação da liminar e a improcedência do pedido.

Após manifestação favorável do representante do Ministério Público (fls.46/48), a julgadora singular, confirmando a liminar anteriormente deferida, concedeu a segurança requestada (sentença - fls.50/52).

Irresignada, interpôs a Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA, este apelo, que, agora, apreciarei.

A tese defendida pela apelante, qual seja, impossibilidade de transferência ex officio da impetrante da SESPI - Universidade Piaiuense (entidade privada) para a Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA (entidade pública), a meu ver, seria perfeitamente aceitável, desde que tivesse se insurgido contra a liminar deferida no início da ação - ABRIL/2002, com a interposição do recurso próprio.

Como se vê, a recorrida, sob a proteção de medida liminar, matriculou-se e vem freqüentando o curso de Direito desde 2002, portanto, há mais de 6 (seis) anos, podendo, até mesmo, ter concluído o curso, o que se presume, já que os autos não dão conta deste detalhe.


Não seria justo e nem razoável que este Tribunal hoje viesse agora reformar a sentença atacada e, em conseqüência, revogar aquela liminar, levando a estudante a perder todo um curso superior de Direito, obrigando-a a renunciar seu emprego para poder voltar a cursar a faculdade no Piauí, ou então, abdicar do curso e do título, se é que ainda não o obteve.

Penso que não se pode descurar da situação criada pelos efeitos da liminar concedida em primeira instância, a final deferida em caráter definitivo pela sentença impugnada. Ora, se a recorrida foi autorizada judicialmente a matricular-se no ano de 2002 e a recorrente, INERTE, deixou consolidar o fato, entendo que não podem ser cassados os benefícios daí advindos.

Não como regra geral, mas em circunstâncias especiais e em respeito a segurança das relações jurídicas, entendo que deva ser preservada a situação da impetrante/recorrida já consolidada e irreversível.

O entendimento ora esposado está em plena consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, vejamos:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. ENSINO SUPERIOR. ESTUDANTE. SITUAÇÃO FÁTICA CONSOLIDADA. DECISÃO JUDICIAL. PRECEDENTES.
1. Agravo regimental contra decisão que negou provimento a agravo de instrumento para garantir ao agravado o direito à transferência de Universidade, com espeque na ocorrência da teoria do fato consumado, aplicável ao caso em apreço.
2. Documentação trazida aos autos que atesta que o acadêmico já deve ter concluído o curso de Direito, ou está prestes a concluí-lo.
3. Liminar concedida há mais de quatro anos e meio, determinando a transferência, sem nunca ter sido cassada e que, pelo decorrer normal do tempo, o impetrante está em vias de concluir o curso.
4. Não podem os jurisdicionados sofrer com as decisões colocadas à apreciação do Poder Judiciário, em se tratando de uma situação fática consolidada pelo lapso temporal, em face da morosidade dos trâmites processuais.
5. Reformando-se a sentença concessiva e o acórdão recorrido, neste momento, estar-se-ia corroborando para o retrocesso na educação dos educandos, in casu, um acadêmico que foi transferido sob a proteção do Poder Judiciário, prestes a terminar seu curso. Em assim acontecendo, não teria o impetrante, com a reforma da decisão, o acesso à reta final do seu curso. Pior, estaria perdendo quase 05 (cinco) anos de sua vida freqüentando um curso que nada lhe valia no âmbito universitário e profissional, posto que cassada tal freqüência. Ao mais, ressalte-se que a mantença da decisão a quo não resultaria qualquer prejuízo a terceiros, o que é de bom alvitre.
6. Cabe ao juiz analisar e julgar a lide conforme os acontecimentos passados e futuros. Não deve ele ficar adstrito aos fatos técnicos constantes dos autos, e sim aos fatos sociais que possam advir de sua decisão. Ocorrência da teoria do fato consumado, aplicável ao caso.
7. Precedentes desta Casa Julgadora.
8. Agravo regimental não-provido.1 (negritei)

ADMINISTRATIVO - ENSINO SUPERIOR - MILITAR - REMOÇÃO COMPULSÓRIA - DEPENDENTE - TRANSFERÊNCIA DE MATRÍCULA - ESTABELECIMENTOS CONGÊNERES - EXIGÊNCIA INAFASTÁVEL - LEI 9.536/97 - INCONSTITUCIONALIDADE - FATO CONSUMADO - PRECEDENTES.
- Declarada a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 9536/97 pelo Eg. STF, firmou-se o entendimento deste STJ no sentido de que a transferência de matrícula de servidores públicos estudantes, removidos de ofício, ou de seus dependentes, deve ser necessariamente entre estabelecimentos de ensino congêneres, i.e., de instituição de ensino público para público, ou de particular para particular.
- Na hipótese dos autos, consolidada a situação da autora de forma irreversível, aplica-se a teoria do fato consumado.
- Recurso especial conhecido e provido.2

ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ENSINO SUPERIOR. TRANSFERÊNCIA. FATO CONSUMADO. OCORRÊNCIA. DESCONSTITUIÇÃO. MAIOR PREJUÍZO DO QUE BENEFÍCIO.
I - A despeito do fato de que a transferência do servidor, ora agravado, não tenha sido realizada por interesse da Administração, mas a pedido seu, conforme afirma a agravante, houve provimento nas instâncias ordinárias para a efetivação de sua matrícula, o que ocorreu a tempo do estudante poder freqüentar o primeiro semestre letivo de 2003.
II - Assim sendo, como mesmo sugerido pela documentação trazida pela agravante, o agravado já cumpriu 1.560 horas/aula, portanto, mais da metade do curso de Ciências Contábeis, não havendo como se afastar da presente hipótese a aplicação da Teoria do fato Consumado.
III - A situação consolidada pelo tempo não se dá somente quando o estudante já houver concluído o curso, mas quando a anulação da transferência inicialmente concedida promover prejuízo a ele e à sociedade maior do que o benefício com isso auferido. Precedentes: EDcl no REsp nº 313.239/RN, Relator Ministro FRANCIULLI NETTO, DJ de 11/04/2005; EREsp nº 143.463/RN, Rel. Min. ADHEMAR MACIEL, Rel. P/ Acórdão Min. ARI PARGENDLER, DJ de 16/11/98.
IV - Agravo regimental a que se nega provimento.3

Anoto por fim que, a despeito das ressalvas à "Teoria do Fato Consumado", que entendo aplicável somente em casos especialíssimos, é fato que a situação retratada nos autos, já consolidada pelo decurso de tempo, não pode se ver ao desamparo por parte do Poder Judiciário, mormente quando foi este quem permitiu a sua ocorrência e a parte adversa quedou inerte em tentar cassar a medida.
Acaso revertida a medida, advirão malefícios à servidora, à instituição e a própria sociedade, sem qualquer benefício individual ou coletivo.

ISSO POSTO,

conheço do apelo, mas para negar-lhe provimento.
É como VOTO.
Fortaleza, 16 de junho de 2008.
____________________________________________________________________________________________
1. STJ - AgRg no Ag 851956/RJ - Agravo Regimental no Agravo de Instrumento; Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, julgado em 03/05/2007, DJ 21/05/2007, p. 550.
2. STJ - REsp 752853/DF - Recurso Especial; Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, Segunda Turma, julgado em 02/02/2006, DJ 28/04/2006, p. 288.
3. STJ - AgRg no REsp 690171/PE - Agravo Regimental no Recurso Especial; Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 27/09/2005, DJ 21/11/2005, p. 140.